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Comece agora

Hoje fico com Amélie

Acabei de assistir ao filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”.
Para quem não conhece a história, eis a sinopse: Amélie era uma criança solitária, que sonhava em conhecer o mundo. Porém, sua ânsia infantil deu lugar a uma vida adulta igualmente solitária cujo refúgio encontrava-se dentro de fantasias, criadas e alimentadas para preencher a si mesma. Um dia, Amélie recebe uma oportunidade de redenção e começa a se tornar sujeito ativo de sua própria vida e interferir na vida das pessoas a seu redor.


Ela é uma sonhadora, porém fica claro em algum momento que a imaginação não é suficiente para preencher seu coração idealista. Embora ingênua e receosa do futuro incerto, Amélie se revela uma menina-mulher corajosa, que decide confrontar suas expectativas românticas com a dor e a delícia da vida no mundo real, e de quebra ajudando a tornar o mundo um lugar um pouquinho mais cor-de-rosa. A película de aspecto surrealista fala da descoberta de si mesmo e da coragem em travar batalhas em busca da própria felicidade, acima de tudo.


Li numa resenha pela internet que Amélie, como Dom Quixote, resolveu atacar o implacável moinho de todas as angústias humanas (curiosamente, livro que comecei a ler ontem, sem ter nenhuma ideia de que tem – teria? Ainda não sei – ligação com a temática deste filme).


Volto a mim um pouco confusa, dando-me conta de características em comum com a personagem principal: idealista, romântica, sonhadora, preocupada em fazer justiça e ajudar as pessoas ao meu redor – e o mundo a ser um lugar melhor. E aí penso: quanta coragem precisamos ter para trocar a idealização pela verdade nua e crua! Será que um dia atingiremos a tão almejada felicidade? Hoje, ficarei com Amélie – acreditar, por que não?

Obs.: Texto de 2019.

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Latas velhas

Certa vez, assistindo a uma palestra no centro espírita que eu frequentava, a palestrante conta uma história. Enquanto realizavam trabalhos de caridade, distribuindo quentinhas a pessoas sem-teto, os irmãos espíritas se depararam com a seguinte cena: três moradores de rua se engalfinhavam numa disputa por uma lata de goiabada. Vazia, velha e enferrujada. Imediatamente, intervieram na pendenga e lhes indagaram: -Por que estão brigando por uma lata velha? Ao que os sem-teto responderam: -Porque a quentinha é mole e a lata serve de apoio para comermos. Então, naquele contexto, aquela lata era valiosa para eles.

Contudo, a palestrante nos convidou a uma reflexão mais profunda. Aquela lata não significa algo que possa contribuir para o aprimoramento espiritual daqueles indivíduos, constituindo-se como uma bagagem que não se carrega para além dessa vida material, terrena e passageira que vivemos. E nos lançou a seguinte pergunta, em tom de desafio: -Por quantas latas velhas vocês já brigaram na vida?

Aquelas palavras me deixaram intrigada e saí daquele encontro refletindo sobre o sentido da mensagem. Claro que a intenção da palestrante era focar nos aspectos importantes para a evolução espiritual do ser humano. Aqui, pretendo dar um enfoque mais amplo a essa questão das latas velhas.

Pensemos em quantas vezes já nos ativemos a rusgas infantis, a teimosias que não levam a lugar algum, apenas para provar um ponto de vista. Em cada ocasião que nos desentendemos com alguém querido – ou mesmo com qualquer pessoa de nossa convivência – por coisas banais. Tanto desperdício de tempo, tanta mágoa criada a troco de nada… Poderiam ter sido evitados caso não estivéssemos apegados à disputa inócua pelas latas velhas, se direcionássemos nossa energia para o que realmente é importante: cultivarmos as amizades, nos esforçarmos por sermos pessoas melhores, nos dedicarmos a fazer o bem.

Nessa hora, lembro-me do ensinamento do meu pai: é melhor ser feliz do que ter razão. Até porque, como li recentemente pela internet, mesmo que não custe dinheiro, se lhe faz gastar tempo, não é de graça. O tempo não volta e não pode escoar pelas mãos sem que nos permitamos a oportunidade de aproveitá-lo com a essência da vida.

E você, até quando vai ficar brigando por latas velhas?

Somos água





Recentemente fui à minha psicóloga e diante dela estava eu, mais uma vez, externando minhas neuroses normais (ou nem tanto) da vida adulta. Um tema recorrente nos últimos tempos é o desejo/dilema de me envolver amorosamente de novo, após quase 2 anos sem essa experiência – e o risco de me magoar com isso.  Eu: “estou com medo”. Doutora psicóloga: “mas você está sendo humana. Há o risco da vulnerabilidade, mas você recebe outras coisas em troca, poder sentir, se apaixonar, se conectar…”

Fui ao trabalho e não pensei muito mais nisso e ao chegar à casa assisti a um vídeo no Youtube da Jout jout (como já mencionei no texto de abertura desse blog, a Júlia é tão incrível que muitas das minhas reflexões se derivam de coisas que a criatividade me traz após ver vídeos dela). Nesse vídeo ela fala de sensações do corpo humano.

Recordei a célebre frase do Eduardo Galeano (em tradução livre do espanhol para o português): “A Igreja diz: o corpo é uma culpa. A Ciência diz: o corpo é uma máquina. A publicidade diz: o corpo é um negócio. E o corpo diz: eu sou uma festa.”

Pensando sobre as emoções e o corpo, comecei a perceber o quanto é incrível e rica a quantidade de sensações que podemos ter e como cada uma delas é especial e tem, inclusive, um papel importante na nossa própria sobrevivência.

As sensações mais fortes da nossa existência, aliás, como não poderia deixar de ser um consectário lógico da biologia e da química, se manifestam em água, que compõe cerca de 70% do corpo humano na fase adulta.

Assim que ao sentir dor e tristeza caímos no choro, o medo e o esforço nos fazem suar pelos poros, a fome e a sede nos brindam com saliva (ou falta de insalivação) na boca e o prazer e o êxtase nos provocam o gozo, a lubrificação.

Queremos e ansiamos pelo prazer, mas da mesma forma que só podemos entender e apreciar a luz quando conhecemos as trevas, talvez nos seja necessária uma pequena quota de lágrimas escorrendo pela face para calar, fundo na alma, todos os nossos fantasmas e, após isso, aprender as lições que devem ser aprendidas na nossa caminhada.

Parafraseando a música do Projota: “Ela já acreditou no amor (…) mas não sabe mais/ Hoje ela só quer paz” agora eu diria: “ Hoje ela acredita no amor – primeiro o próprio, depois o recíproco”.

Até porque nada impede que algumas dessas lágrimas sejam de alegria, não é mesmo?

Obs.: texto originalmente escrito em 15/07/2019.

As galochas

Quando ela era pequena, sua mãe a cobria com uma capa de chuva e punha-lhe galochas, para protegê-la das tormentas da cidade.

O tempo passou, e aquela garota, hoje uma mulher, trocou a capa – tão infantil – por um guarda-chuva, até mesmo nas garoas mais finas.

Um belo dia, no entanto, uma tempestade arrebatou todas as suas defesas. Os efeitos foram sentidos de imediato: penteado desfeito, roupas encharcadas, o arrepio do frio e um resfriado nos dias seguintes. Mas a visão do arco-íris que se formou após o dilúvio jamais foi esquecida pela moça.

Hoje, mais experiente, ela aposentou os guarda-chuvas. Concluiu que são desnecessários nos chuviscos, os quais passou até a apreciar, e inúteis nas tempestades, já que vai acabar ensopada de um jeito ou de outro…

Conserva, contudo, o costume de usar galochas, para permitir se molhar por inteiro, porém manter a salvo seus pés no chão.

O feminismo e o mito do amor romântico

Tradução livre do inglês/ Pra cego ver: Imagem com fundo rosa. Nela se veem um homem beijando a mão de uma mulher e os seguintes dizeres em negro: “Boa sorte tentando conciliar suas convicções feministas com o Dia dos Namorados”

Começo este texto com a plena consciência de que não sou especialista no tema desta postagem nem quero esgotar o assunto por aqui. Aliás, para mim, conhecimento – e pessoas que se dispõem a obtê-lo – estão sempre em construção.

Dito isso, gostaria de compartilhar uma catarse muito forte e poderosa que tive recentemente ao assistir a um filme. Talvez quando mergulhamos muito fundo em nós mesmos de alguma forma o universo nos aponte a direção certa para adquirirmos aquilo de que precisamos.

E por que digo isso? Porque no início do filme eu o detestei. É mais um roteiro padrão e previsível entre tantos de comédia romântica. Mulher na casa dos 30 (trinta) anos, independente financeiramente, educada, bonita, bem sucedida, frustrada e surtada porque nenhum dos seus relacionamentos levam ao tão sonhado “final feliz” – casar, constituir família etc.

A sinopse do enredo é: Dineo está emendando um relacionamento atrás do outro desde a faculdade, buscando cumprir uma expectativa familiar e social de se casar, procriar e ter o tal conto de fadas esperado. Depois de vários relacionamentos curtos, ela se envolve mais com Lunga e rapidamente vão morar juntos. Logo, ela descobre que, na verdade, ele está prestes a se casar com outra mulher e lhe omite este fato. Dineo, por sua vez, termina o relacionamento e tem vários episódios de perseguição ao ex, se expõe excessivamente nas redes sociais, começa uma vibe autodestrutiva que quase custa seu emprego, passa a sair pra balada, ficar super bêbada, passar mal todo final de semana, coisas do tipo.

A contraposição da protagonista é feita pela melhor amiga Noni, solteirona convicta, adepta apenas de relacionamentos casuais estilo “one night stand” e bem resolvida, que a ajuda a passar por tudo isso com um pouco mais de dignidade.

Depois de passar muita vergonha e de ter vários comportamentos psicóticos por causa da baixa autoestima que deveriam ser tratados no divã, a trama sofre um plot twist: o ex se divorcia, volta se dizendo apaixonado e a pede em casamento quase de imediato. Ela acaba recusando o pedido e, finalmente, tem sua redenção e fica “de boas na lagoa” sozinha, recuperando o amor próprio que jamais deveria ter perdido (amém, igreja!).

***Parênteses: Para quem se interessar, o filme se chama “Solteiramente”, está na Netflix e é sul africano, acabando justamente num safári no Kruger National Park. Além de mostrar que há êxito em outras produções cinematográficas ao redor do mundo além de Hollywood, fiquei muito feliz de relembrar minha última viagem de férias neste país maravilhoso (que não pôde incluir uma visita ao parque, mas já está na agenda para uma próxima oportunidade).

Voltemos novamente à catarse antes anunciada. A frase da protagonista de que “eu não estou apaixonada por você, mas pela ideia de não ficar solteira” quando recusa o pedido de casamento me provocou uma reflexão muito forte, pois é o que acontece conosco enquanto mulheres na sociedade atual (que atire a primeira pedra a mulher que nunca passou por isso). E por quê?

Precisamos lembrar que o casamento há alguns séculos era um mero contrato por interesse ou conveniência. Isso se vê bem claramente na nossa história de casamentos arranjados entre a nobreza até o século XVIII, buscando unir famílias com interesses econômicos e políticos semelhantes. O conceito de amor, senão inexistente, era secundário e desprezado.

No entanto, desde que “inventaram” o construto social do amor romântico, e por motivos arraigados na nossa sociedade patriarcal, criou-se a figura da mocinha casadoira; da mulher que deveria cumprir os requisitos de subserviência, virtude, prendada e boa procriadora. Para famílias da elite, ser culta, bem educada e versada em alguma arte ou idiomas, porém sem ofuscar/desrespeitar a figura masculina publicamente, também era um diferencial.

Esse ideal da mulher honesta, da mulher “para casar”, e as aspirações do casamento, foram alçados ao patamar de pilar da sociedade, sustentado por uma indústria cultural que mostra o enlace “por amor” como expressão da individualidade burguesa, estimulada pelos livros, filmes e periódicos de então.

Juridicamente, o casamento ainda é um contrato solene, porém a configuração da união entre duas pessoas passou por diversas transformações ao longo do tempo. Tanto é que várias autoras feministas o rejeitaram expressamente, como Simone de  Beauvoir e Carole Pateman, que o viram como a pura submissão da mulher ao jugo machista.

“Casamento é o destino tradicionalmente oferecido às mulheres pela sociedade. Também é verdade que a maioria delas é casada, ou já foi, ou planeja ser, ou sofre por não ser” (Simone de Beauvoir)

Ao mesmo tempo, o casamento moderno foi ressignificado, passando a admitir uniões homoafetivas e sendo equiparado à “união estável”, devendo-se pontuar que hoje em dia muitos casais ditos desconstruídos e de esquerda passaram a adotar o termo “companheiros” para se dirigir a uns e outros, ou mesmo a negar a monogamia e adotar outras configurações de relacionamento. No entanto, não é disto que tratamos hoje.

Vendo o filme, me veio uma ideia muito estranha de que esse roteiro sempre retrata uma mulher mais madura, desesperada para casar, fazendo de tudo “por amor” de forma unilateral, para manter um relacionamento. Além de colocar o relacionamento como algo necessário e ideal para que a mulher seja vista como alguém socialmente adequado e aceito.

Nunca vi comédia romântica onde o homem é o protagonista! Aliado ao bastante questionável fato da mulher ser colocada como alguém digno de pena ou de asilo psiquiátrico, parece que homem não ama, não sofre, também não quer estar com alguém?… Acho o cúmulo aquele bonequinho de topo de bolo onde o homem está amarrado sendo puxado pela mulher, como se unir sua vida a alguém fosse um sacrifício tão grande que ele precisasse ser convencido ou coagido a embarcar nessa ideia. Que porra é essa?

**(“que a deusa me dibre” de se um dia eu casar usar esse tipo de figura no meu bolo hahaha)**

Parece algo muito arcaico essa ideia de mulher ideal? Corta para vinte anos atrás.

Na minha adolescência, era normal revistas como Capricho, Todateen, Carícia, trazerem na capa e no seu conteúdo: “dicas de como conquistar o gato”, “como saber se ele está a fim de você”, “aprenda um beijo que vai deixa-lo louco” (para o público feminino adulto as dicas indicavam também como ser boa de cama etc).

O que os garotos da minha idade liam? Playboy, Sexy e afins. “Liam; diga-se: folheavam as páginas de mulheres nuas e procuravam pornografia na internet. Não é por acaso que hoje, quando o feminismo está tão em voga, o descompasso entre os relacionamentos heterossexuais é tão grande, com mulheres ainda precisando batalhar o seu reconhecimento equiparado dentro da sociedade conjugal e não apenas o papel de esposas, mães e donas de casa.

Também não é à toa que a mulher é sempre vista dessa forma. Como a nossa socialização enquanto crianças é feita? Quem ganha bonecas e panelinhas para brincar de casinha?! Já os meninos ganham os brinquedos legais: os skates, os videogames de aventuras, etc., mostrando a eles que o seu espaço na sociedade pode ir além do âmbito doméstico – este, lugar apenas das fêmeas.

Ainda por cima, nós meninas crescemos ouvindo que aquele coleguinha da escola que nos inferniza faz isso porque ele gosta da gente e, coitadinho, ele não sabe se expressar, por isso acaba demonstrando justamente o inverso. E isso cria todo um inconsciente coletivo associando maus tratos com amor. Que coisa doentia a gente ensinar isso às nossas crianças! Chega, abusos nunca devem ser romantizados.

Vejam bem que esse texto não se destina a criticar os homens, mas a estrutura patriarcal na qual estamos inseridos, devendo ser compreendido que ambos homens e mulheres somos socializados dentro de uma sociedade machista e sofremos influências de diversas naturezas (muitos modelos de masculinidade tóxica afetam perniciosamente os homens, por exemplo, mas isso já é assunto para outra reflexão).

Contraditoriamente, somos filhas de uma revolução trabalhista e sexual que reposicionou o gênero feminino na nossa sociedade. Sim, queremos ser CEO, mas também temos o direito a amar e sermos amadas. A gente queimou o sutiã mas guardou a esperança do “felizes para sempre” dos contos de fada lá naquele cantinho que nenhuma feminista quer admitir.

Porém, a que preço estamos nos submetendo a relações insatisfatórias e desiguais (para não falar abusivas, muitas vezes), que não raro nos limitam em avançar nos estudos, carreira, vida social enquanto nos sugam emocional, financeira, mental e fisicamente como cuidadoras de toda a família e escravas do lar? (Dica: leia/assista Iara Dupont para mais informação sobre isso https://www.instagram.com/iaradupont/?hl=pt-br)

Não há nenhum problema em querer uma união nos moldes tradicionais, e até ser dona de casa, porém é importante ter em vista que existem opções que foram conquistadas pela luta feminista ao longo de séculos e que, além disso, casamento e filhos não são garantia de felicidade, até mesmo porque o príncipe encantado ficou só nos livros. Acredito que é possível ter uma relação amorosa saudável, porém ela tem que começar com você mesma. Primeiro o amor próprio, depois o recíproco, porque até no “eu te amo” o Eu vem primeiro. Assim, você poderá ser feliz de várias formas, seja casada e mãe, seja solteira e sozinha, como melhor lhe couber.

Bolsonarismo, ódio e outros contos

Há alguns dias, eu li por aí uma frase mais ou menos assim, pichada no muro do bairro onde moro (obs.: não lembro o autor, se você souber, deixe aqui nos comentários):

“Algumas pessoas se agarram tão fortemente ao ódio, pois, caso o soltem, terão que olhar para dentro de si”.

Parece que, no momento político em que atualmente vivemos, esta afirmação cabe, pelo perdão do clichê, como uma luva. Muitas pessoas dão-se a opinar sobre assuntos que desconhecem, a rejeitar ideias diferentes das que sempre tiveram com base em visões distorcidas e pré-concebidas, descartando inclusive dados científicos checados e consagrados mundialmente, por puro medo e desinformação.

Não é estranho lembrar que um presidente (e diversos outros asseclas de seu clã e aliados políticos) eleito e mantido no poder com base na disseminação de fake news[1] e profundo entusiasta da ignorância como projeto político[2] se beneficie em difundir a invisibilidade ou o temor sobre assuntos que pretende excluir da pauta do dia[3] com fundamento no profundo desconhecimento da população sobre a realidade dos fatos.

Vê-se que na atual era pós moderna, contudo, o fenômeno do Bolsonarismo vai além do conceito de hegemonia cultural cunhado por Antônio Gramsci, para o qual a classe dominante exerce seu poder sobre a classe dominada através do controle do sistema educacional, das instituições religiosas e dos meios de comunicação e encontrando como um de seus contrapontos a escola ou educação formal, que, ao dar acesso à mesma formação intelectual da classe no poder, poderia servir à emancipação de seus subordinados.

Aqui, o sistema de dominação se sofistica e aproxima das práticas de manipulação fascista, cujo expoente máximo foi Joseph Goebbles, ministro da propaganda do Partido Nazista alemão, que ficou famoso pela frase “uma mentira dita cem vezes torna-se verdade”.

As notícias distorcidas ou absolutamente inverídicas e a escolha de inimigos políticos tingidos de cores maniqueístas (no caso, o PT em especial), além da ausência ou pobreza do debate de temas complexos, criam um discurso conveniente e recriam a verdade a serviço de seu projeto de poder.

Não é nova a noção de falsificação histórica com finalidade de extermínio político. Já no Império Romano (e até em épocas mais remotas da humanidade), por exemplo, havia a aplicação da pena Damnatio memoriae, que em latim quer dizer “condenação ao esquecimento”.

No Direito Romano, ela consistia no apagamento de qualquer vestígio do nome ou imagem de uma pessoa, como se essa jamais tivesse existido, uma vez que além do confisco de sua propriedade e perda de títulos, culminava na destruição de bustos e estátuas erigidas em sua homenagem, em apagar sua imagem de retratos, no desfazimento de selos e assinaturas em documentos e moedas oficiais, etc – penalidade que se estendia, também, aos membros de sua família. Tratava-se, portanto, de uma pena particularmente dura e desonrosa, reservada sobretudo a figuras públicas proeminentes acusadas de crimes como alta traição, sendo considerados inimigos da Casa Imperial ou do Senado romano, caindo em desgraça pública.

Podemos ver que, assim, a utilização destas formas violentas de vilipêndio à história e memória popular tem uma finalidade bastante clara e maliciosa, que revela em última análise o temor em perder o domínio político.

Lamentavelmente, contudo, como a vida imita a arte, deixo para reflexão de vocês as sábias palavras de Mestre Yoda sobre os riscos da apologia ao totalitarismo:

“O medo leva à raiva, a raiva leva ao ódio e o ódio leva ao sofrimento O medo é o caminho para o lado negro da força”.


[1] https://istoe.com.br/bolsonaro-o-candidato-fake/

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/26/politica/1537997311_859341.html

https://www.valor.com.br/politica/5965577/estudo-diz-que-90-dos-eleitores-de-bolsonaro-acreditaram-em-fake-news

https://aosfatos.org/todas-as-declara%C3%A7%C3%B5es-de-bolsonaro/

[2] Vide diversas notícias recentes com ataques à autonomia universitária, difamadoras de instituições de ensino, contrárias/com cortes a investimentos na educação com base inclusive em chantagens políticas, censura da mídia e de programas de fomento à cultura e diversidade, desqualificação de renomados centros de pesquisa e de conhecimentos científicos consolidados há séculos, por exemplo:

https://oglobo.globo.com/sociedade/bolsonaro-reclama-de-autonomia-das-universidades-coisas-absurdas-tem-acontecido-23799959

https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,mec-cortara-verba-de-universidade-por-balburdia-e-ja-mira-unb-uff-e-ufba,70002809579

https://www.brasil247.com/midia/bolsonaro-censura-globo-valor-estado-folha-e-uol-em-coletiva

https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/07/19/se-nao-puder-ter-filtro-nos-extinguiremos-a-ancine-diz-bolsonaro.ghtml

https://istoe.com.br/bolsonaro-fez-ataques-inaceitaveis-diz-diretor-do-inpe/

[3] Seja por serem polêmicos, contrários aos interesses políticos de seus apoiadores ou apenas porque não são considerados relevantes em seu programa de governo, a exemplo do já supracitado questionamento sobre os dados de desmatamento da Amazônia, que contrariam interesses econômicos, e a fome no Brasil, problema de pobres que não são destinatário das políticas públicas de seu mandato.

https://noticias.r7.com/brasil/bolsonaro-falar-que-passa-se-fome-no-brasil-e-uma-grande-mentira-19072019

Imagine… TUDO O QUE SE TORNA POSSÍVEL PARA PESSOAS QUE COMEÇARAM A PODER.

Como mencionei no post de apresentação, uma das fontes das quais estou bebendo avidamente e que me estão estimulando intelectualmente a ponto de achar que tenho conteúdo para escrever algo são as leituras que tenho empreendido no período recente.

Uma delas é o livro “Primavera num espelho partido”, de Mário Benedetti. Esse livro foi escrito pelo autor uruguaio quando ele esteve no exílio durante a ditadura militar em seu país, e mistura capítulos de ficção lírica com elementos autobiográficos e relatos reais. Nessas passagens realistas, me surpreendi lendo um trecho que, por sua imensa sensibilidade e profundidade, abaixo transcrevo.

Porém, creio que para compreendê-lo em toda sua inteireza, é necessário primeiro contextualizar a citação. O trecho faz parte do discurso de Daniel Cámpora em 20/03/1981, quando da comemoração de sua libertação como preso político na ditadura militar uruguaia, em agradecimento à solidariedade dos que lutaram pela sua liberdade, especialmente a comunidade da escola de Holweide, em Colônia – Alemanha, onde seus três filhos estudaram durante o exílio, citado pelo livro de Benedetti.

“Tão, mas tão novo quanto pode ser o calor das pessoas voltadas para fora de si mesmas, das pessoas capazes de querer bem aos outros. Aqui também há muita grandeza nesta noite. Há a necessidade imperiosa de continuar fazendo, de continuar podendo. Porque vocês puderam. Puderam mais que a brutalidade de uma ditadura, mais que a obstinação e o ódio dos carcereiros, mais que a preguiça e a comodidade de uma vida para si mesmos. Vocês puderam e estou aqui como prova do poder de vocês. Prova, mas não medida. POIS NÃO HÁ MEDIDA QUE POSSA ABARCAR TUDO O QUE SE TORNA POSSÍVEL PARA PESSOAS QUE COMEÇARAM A PODER.”

Essa última frase do discurso de Daniel Cámpora me deixou extasiada. Vivemos tempos em que a esperança de dias melhores para o país e o mundo parecem apenas o eco de um sonho distante. No entanto, vamos olhar para a humanidade com olhos mais generosos? O trabalho coletivo em prol do bem comum foi capaz de reconstruir cidades destroçadas no pós-guerra, descobrir a cura do câncer, levar o homem ao espaço… será que apenas não nos falta “começar a poder?” Quando entendermos isso a nível de sociedade, não haverá limites para o poder coletivo e popular transformar a realidade que nos cerca. Eu acredito!

Crônica de uma gravata amarela

Era um dia nublado e chuvoso e ela estava ali, desfilando em meio a todas as cores tristes do arco-íris, como em tom de desafio aos passantes.

Eu a notei de relance e vi que se tratava de uma gravata amarela, com algum tipo de padronagem que não consegui distinguir àquela distância. Minha imaginação preencheu essa lacuna como sendo um estampado de bichinhos, quiçá dos populares Minions.

Imaginei que fosse seu filho que a tivesse escolhido. “Olha, papai, coloca aquela gravata amarela que te dei de aniversário”. E o pai, orgulhoso, dá um beijo no garoto e resolve quebrar a monotonia de seu terno preto com ela.

Não ligou para os olhares enviesados do chefe ou para as piadas dos colegas quando chegou ao trabalho. 

Ele se olhou no espelho do banheiro e deu um sorriso de soslaio para si mesmo. O que importava era que aquele símbolo ostentado no peito lembrava a alegria de seu filho, e era daquilo que ele precisava para enfrentar mais uma maratona de 12h de trabalho em meio a ternos pretos e cinzas, tão elegantes quanto melancólicos. 

Hoje, em algum lugar no centro do Rio de Janeiro, num escritório de advocacia, existe fofura.

Apresentação e por que resolvi escrever um blog

Este blog fala de sonhos, paixões, dor, alegria, luta e esperança.

Há algum tempo, aliás, acho que desde tenra infância, gosto de ler e escrever. Isso inclusive me brindou com uma facilidade e interesse no aprendizado de outros idiomas – ou foi essa aptidão com línguas, a começar com a portuguesa, que me fez gostar disso? Não sei dizer ao certo, creio que este é o equivalente literário ao paradoxo[1] da Biologia quando perguntamos se o que nasceu primeiro foi o ovo ou a galinha.[2]

Superando essa discussão que talvez não nos leve a nenhuma conclusão útil, comecei recentemente a sentir que gostaria de ser escritora. E aí comentei esse sonho secreto de princesa com a minha mãe, que disse para eu fazê-lo, se assim me parecesse bom. E eu disse: mas não sei se tenho material para escrever um livro. E ela emendou: então escreva um blog. Na minha insegurança normal de principiante (em especial aspirante a escritora de sabe-se lá o quê num país onde a leitura sequer é apropriadamente valorizada), indaguei: e quem vai querer ler o que tenho a dizer? Minha mãe disse que muita gente gostaria (aquele incentivo de mãe, né?), e que ela leria. Então, sob pena de ninguém mais ler isso aqui, resolvi dar um salto de fé e escrever alguma coisinha que me agrade e possa, também, quiçá, interessar a mais alguém.

Digo a vocês que, após um período árido de parcas leituras, este ano voltei a consumir literatura de qualidade[3] e outras referências bacanas como alguns canais do Youtube[4], que têm me levado a divagações fora do lugar comum. Então, achei que valia a pena começar um blog e divulgar um pouquinho do que se passa na minha maravilhosa cabecinha imaginativa.

Talvez um pouco dessa motivação tenha raízes puramente egoístas, ou seja, extravasar pensamentos e sentimentos que não cabem em mim e que eu, narcisicamente, acho que devo expor ao mundo em vez de guardá-los para mim. Mas, ao mesmo tempo, creio que algumas questões têm uma abrangência tão universal que elas podem provocar sentimentos bacanas em outras pessoas e com isso, trago acalentada tal expectativa otimista.

Revelo aqui mais um aspecto da minha personalidade: além de um pouquinho sonhadora à la Amélie Poulain (porém amadurecida após algumas porradas da vida), também sou otimista nata e procuro continuar sendo, mesmo quando os dias não parecem os melhores.

Para quem veio buscando algo muito específico, lamento eventualmente desapontá-los, mas não posso apontar uma temática central neste veículo. Meu conteúdo, no entanto, abordará temas como sonhos, paixões, dor, alegria, luta e esperança, entretanto, pretendo abordar até mesmo os assuntos porventura ácidos a partir de uma perspectiva positiva e transformadora.

Sejam bem-vind@s! Vamos começar?


[1] Na verdade, trata-se de um aparente paradoxo, que já foi desvendado pelos cientistas da atualidade. Considerando-se que, segundo as ideias de Charles Darwin, na escala evolutiva os antecedentes das aves são os répteis, que já punham ovos, o ovo antecederia as galinhas, que provavelmente eclodiram de um ovo no qual houve mutação genética capaz de inaugurar este novo reino animal.

[2] P.S.: Eu conhecia a resposta anterior de leituras realizadas, porém fui pesquisar fontes jornalísticas bacanas para inserir no texto e eis que parece que a questão ainda é considerada um paradoxo pela ciência, dividindo os estudiosos em suas teorias distintas. Veja mais em:

https://super.abril.com.br/historia/quem-nasceu-primeiro-o-ovo-ou-a-galinha/

https://www.terra.com.br/noticias/educacao/voce-sabia/quem-nasceu-primeiro-o-ovo-ou-a-galinha,0908859fd53ea310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html

https://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-noticias/redacao/2013/09/10/clique-ciencia-quem-veio-primeiro-o-ovo-ou-a-galinha.htm

[3] Estou assinando uma espécie de clube do livro moderno, chamado TAG Livros. Um dia farei um post sobre a importância da leitura e pretendo falar sobre a minha experiência com eles como assinante (não tenho qualquer vínculo pessoal ou profissional com os responsáveis).

[4] Meu favorito é o Jout Jout Prazer, também não tenho nenhuma relação com a mesma, apenas gosto muito das suas reflexões e a recomendo.